UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE EDUCAÇÃO
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM METODOLOGIA DO ENSINO DE ARTE
DISCIPLINA: FUNDAMENTOS ANTROPOLÓGICOS DA ARTE
PROFESSOR: Dr. ALEXANDRE BARBALHO
ALUNO: HENRIQUE GOMES DE LIMA
Pensando a Arte como Sistema Cultural, a partir de Geertz
As variações de um povo
para outro e também de um indivíduo para outro e de todas as demais capacidades
humanas constituem uma experiência coletiva que transcende no tempo e no
espaço. A bagagem intelectual com a qual ordenamos nossa experiência é muito
variável e grande parte desta bagagem é culturalmente relativa, pois é
determinada pela sociedade.
Nesse contexto as
manifestações da Arte incorporam em sí um significado cultural e que pode,
partir de uma realidade local, buscar coro em outros espaços e tempos. A
compreensão dessa realidade, adquire um caráter de sistema a partir do momento
em que ao explorar a sensibilidade percebe-se que sua formação é essencialmente
coletiva e que suas bases são tão amplas e tão profundas como a própria vida
social. A ligação entre arte e vida coletiva existe no plano simiótico e se
materializam em uma forma de viver e traz ainda um modelo específico de pensar
o mundo e com este relacionar-se.
Por isso, a cultura é vista
pelo autor como um sistema simbólico, oriundo da concepção simbólica da
linguagem, por considerar que a presença do homem no mundo não é imediata, mas
mediatizada pela linguagem. Nesse sistema, a linguagem desempenha funções de
significação que estão na origem das elaborações dos sentidos do homem no mundo
ao expressar as diferentes maneiras de sua relação com uma mesma realidade, e
ao expressar de uma mesma maneira a sua relação com realidades diferentes. Ao
falar, o homem não se limita a designar e a significar a sua relação com um
mundo preexistente; constrói também sentidos novos já que as palavras não são
etiquetas coladas a uma realidade singular, mas construções culturais
destinadas a mediatizar a relação do homem com o mundo. E é na elaboração e
construção desse mundo que a mediação com a realidade é feita sob os auspícios
de uma epistemologia do senso comum, visto por Geertz como um sistema cultural, construído
historicamente e, portanto, sujeito a padrões de juízo também historicamente definidos e validados pela
convicção de quem o possui. Afirma o autor que: (...) “Tornar-se humano é
tornar-se individual, e nós nos tornamos individuais sob a direção dos padrões
culturais, sistemas de significação criados historicamente em termos dos quais
damos forma, ordem, objetivo e direção às nossas vidas. (...) Assim como a
cultura nos modelou como espécie única - e sem dúvida ainda nos está modelando
- assim também ela nos modela como indivíduos separados. É isso o que temos
realmente em comum - nem um ser subcultural imutável, nem um consenso de
cruzamento cultural estabelecido.” (GEERTZ,l989,p.64)
Segundo Geertz, o argumento do
senso comum não se baseia em coisa alguma, a não ser na vida como um todo.
Nesse caso, trabalha com a sabedoria coloquial que julga e avalia a realidade
com bom senso, ou seja, lida com os problemas cotidianos com critério, inteligência,
discernimento e reflexão prévia. O senso comum é, dessa forma, um modo de
ver o mundo, através da aceitação desse mundo, dos seus objetos e dos seus
processos exatamente como se apresentam, como parecem ser. Há também um desejo de
atuar sobre esse mundo de forma a dirigi-lo para propósitos práticos, dominá-lo
ou ajustar-se a ele. Neste universo, nem totalmente material nem puramente
simbólico, ora fasto ora nefasto, cada coisa tem seu peso, seu lugar, seu
significado, sua qualidade, seu sentido. O bom senso, assim, é uma capacidade que
o sujeito possui de captar as realidades básicas através da experiência e de
chegar a conclusões sensatas, sem fazer distinções entre a ordem natural, o
domínio da linguagem, o mundo da cultura e a esfera da consciência individual.
Não há diferenciação brusca e racional entre um universo material e um universo
simbólico, visto que as necessidades orgânicas e as morais confundem-se no
cotidiano da vida grupal, dando-lhe um realismo prático, um senso vivo dos
limites e das possibilidades de ação que convergem para uma sabedoria
cotidiana.
Para Geertz, “A limitação da análise interpretativa na
maior parte da antropologia contemporânea ao aspecto supostamente mais
‘simbólico’ da cultura é um mero preconceito, nascido da noção, também
presenteada pelo século XIX, de que o ‘simbólico’ se opõe ao ‘real’.(GEERTZ
1980:170)”. Em sua obra, o autor propõe
uma refiguraçãodo pensamento social deslocando
a análise dos produtos culturais de leis e instâncias para casos e
interpretações ao trabalhar com o que denomina uma etnografia do pensamento, isto
é, como as estruturas do pensamento mudam; como as províncias do pensamento são
demarcadas; como as normas de pensamento são mantidas; como os modelos de
pensamento são adquiridos e como o trabalho do pensamento é dividido para
compor o que ele denomina do processo da intersubjetividade dos sujeitos da
ação.
Essa intersubjetividade é um traço objetivo, na
medida em que não é mais subjetividade do autor d a obra, nem tampouco, apenas a
subjetividade do apreciador, mas uma espécie de linguagem mediada dessas
subjetividades. O caráter objetivo da intersubjetividade, portanto, vem do fato
de ela ser uma mediação necessária entre objetividade e subjetividade, quando
da situação de interpretação. Diz ainda que: “a escrita fixa o significado do
acontecimento: “um pedaço da interpretação antropológica consiste em traçar a
curva do discurso social; fixá-lo numa forma analisável”. Geertz parte de Max
Weber e de sua concepção de cultura não codificável mas interpenetrável, para
dizer que o homem é um animal suspenso em teias de significados que ele mesmo
tece ao longo de sua existência social e histórica. São essas teias que definem
a cultura e sua análise não deve se constituir numa ciência experimental em busca
de leis, mas numa ciência interpretativa em busca de significados para os
sujeitos da ação.
O entendimento desse sistema, “não
como complexo de padrões concretos de comportamentos - costumes, usos,
tradições, feixes de hábitos -, mas como um conjunto de mecanismos de controle
- planos, receitas, regras, instruções, programas e pré-programas - para
governar o comportamento. O homem é precisamente o animal mais dependente de
tais mecanismos de controle, extragenéticos, fora da pele, de tais programas
culturais, para ordenar seu comportamento”. A seu ver, a cultura engloba, no
interior da prática cultural, todo um conjunto de códigos e convenções
simbólicas onde as mediações são feitas, fundamentando relações de sentidos
explícitos e implícitos, segundo os significados dados em cada momento. É em função
disso que a cultura pressupõe que um campo semântico seja partilhado para que possa
ser lida e seus sentidos interpretados, mesmo numa leitura de segunda mão, por
sobre os ombros, isto é a leitura de uma leitura.
Para o autor interessa
perguntar não qual o status ontológico de um fenômeno, mas o que foi
transmitido com a ocorrência de cada teia dentro do sistema simbólico. Onde e para
quem cada teia diz o que, em que momento, com qual intenção? Neste caso, a cultura
- a totalidade acumulada de padrões culturais - em vez de ser acrescentada a um
animal acabado, é um ingrediente essencial na produção desse mesmo animal. A
cultura fornece o vínculo entre o que os homens são intrinsecamente capazes de
se tornar e o que cada um efetivamente se torna. O autor trabalha na direção de
uma antropologia interpretativa e propõe uma definição de cultura, a partir da
noção de homem, numa tentativa de resolver o paradoxo entre a idéia de uma
imensa variedade
cultural em contraste com a idéia de uma espécie
humana única. Para isto, refuta tanto a idéia de uma forma ideal e essencial de
homem natural, dotado de habilidades inatas, proposta pelo iluminismo, quanto a
idéia de um homemconsensual (e, como consequência, a noção de consensus
gentium), relacionada ao comportamento real, proposta pela antropologia
clássica.
Conclui-se portanto, que as
rugosidades do espaço e as impressões materiais e imateriais nele postas,
constituem um complexo sistema de significados e que têm na arte uma das formas
de se manifestar.
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